Conexao1
Nenhum resultado
Ver todos os resultados
  • Esportes
  • Entretenimento
  • Economia
  • Conexão Política
  • Tecnologia
  • Gastronomia
  • Automobilismo
Conexao1
Nenhum resultado
Ver todos os resultados
Nenhum resultado
Ver todos os resultados

Muitas pedras no meio do caminho

por Conexão1
26/10/25 | 07:04
em Cotidiano
Lula (E) e Donald Trump (D)
Reprodução

Lula (E) e Donald Trump (D)

O encontro com o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, não consta da agenda oficial do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que desembarcou na sexta-feira em Kuala Lumpur, na Malásia, para participar, na condição de convidado, da reunião de cúpula da Associação das Nações do Sudeste Asiático. Também não foi mencionado entre os compromissos oficiais agendados pela Casa Branca — mas o próprio presidente Trump admitiu, a bordo do Air Force One, enquanto voava para Kuala Lumpur, que o encontro deve acontecer neste domingo.

Trump desembarcou na Malásia no sábado como o protagonista da reunião dos líderes de um grupo de países que, ao lado da Índia, estão entre as economias que mais crescem atualmente.

A trajetória dos países do Sudeste Asiático nos últimos anos explica o interesse de Lula, de Trump e de outros chefes de Estado pela reunião que acontece neste final de semana. Camboja, Filipinas, Indonésia, Laos, Malásia, Singapura, Tailândia e Vietnã, além de Brunei, Mianmar e Timor Leste — recentemente incorporado ao bloco — contam com uma população somada de 680 milhões de pessoas e têm em comum o fato de terem superado as dificuldades extremas em que viviam há duas ou três décadas.

Se continuarem no caminho que vêm seguindo em suas economias, como tudo indica que continuarão, e, sobretudo, se mantiverem o respeito pelo equilíbrio fiscal, logo estarão em uma situação semelhante à da Coreia do Sul. Para quem não se recorda, a Coreia do Sul era um país miserável até meados dos anos 1980. Tomou decisões necessárias e, em cerca de 40 anos, se transformou em uma economia rica, próspera e capaz de proporcionar oportunidades e bem-estar a seus cidadãos.

Os países do Sudeste Asiático — que isso sirva de lição ao Brasil — têm em comum o fato de terem tomado decisões que, uns mais e outros menos, abriram as portas para um ciclo vigoroso de desenvolvimento. De um modo geral, apostaram na industrialização e em relações comerciais desimpedidas com os países desenvolvidos como mola propulsora de seu desenvolvimento. Isso fez com que, ao longo deste século, deixassem a condição de peões secundários para se tornar peças estratégicas no tabuleiro geoeconômico global.

A inflação da Malásia é inferior a 1,5% ao ano e a atual taxa de crescimento é robusta, de 5,1%. Nas Filipinas, a inflação anual é de 1,3% e o crescimento, de 5,5%. A Indonésia registra uma inflação de 2,5% ao ano e um crescimento de 5%. O Vietnã tem uma inflação mais elevada do que a de seus vizinhos: 3,38% em um ano, porém cresceu 8,3% no ano passado. Os demais países da região seguem trajetórias semelhantes. Apenas para efeito de comparação, o Brasil tem uma inflação de 5,17% ao ano (bem acima do teto da meta definida pelo Conselho Monetário Nacional, que é de 4,5%) e deverá crescer, na melhor das hipóteses, 2,11% em 2025, conforme o Boletim Focus do Banco Central.

Produtos sofisticados

Esses números sugerem que uma aproximação com esse grupo de países pode gerar benefícios para o Brasil. Aprender com eles, então, geraria benefícios ainda maiores. Os países do Sudeste Asiático são destinos possíveis para parte das mercadorias brasileiras que deixaram de ser exportadas para os Estados Unidos desde a tarifa de 50% imposta por Trump, em agosto passado. Mas isso não resolve o problema. Por mais promissoras que sejam, essas economias precisam evoluir muito até reunirem as condições necessárias para absorver os produtos mais sofisticados e de maior valor agregado da pauta de exportações brasileiras — que, antes da tarifa, eram vendidos para o gigante norte-americano.

O resumo da história é o seguinte: a ampliação do comércio com os novos ricos do mundo é desejável e pode até compensar, em parte, a redução da entrada de dólares causada pela queda das exportações para os Estados Unidos. Mas não preenche uma lacuna aberta pela interrupção das vendas de um grupo especial de mercadorias que o mercado americano, e apenas ele, tem condições de importar neste momento.

As tarifas de 50% praticamente inviabilizaram as exportações de máquinas e equipamentos agrícolas para os Estados Unidos. O mesmo vale para máquinas industriais, autopeças, transformadores elétricos, móveis e madeira processada e outros itens da pauta nacional de exportações que são mais nobres do que os alimentos in natura. A restrição à entrada desses produtos no mercado americano pode gerar não apenas prejuízos para os fabricantes desses equipamentos, mas para todo o ecossistema de fornecedores e trabalhadores que se organizou em torno deles.

Caso o litígio com os Estados Unidos se prolongue, isso pode custar, por exemplo, um corte irrecuperável de empregos bem qualificados e bem remunerados, além de representar um retrocesso no que existe de mais moderno e dinâmico na indústria nacional. E gerar uma reação em cadeia que, no final das contas, fará do Brasil um lugar pouco confiável aos olhos dos investidores internacionais.

Para alguns analistas, esse fenômeno de consequências negativas já começou. Prova disso é o resultado das Contas Externas do país, que atingiu um déficit de US$ 9,8 bilhões em setembro — o pior resultado desde 1995. Isso se deve não só à redução do superávit comercial, mas também ao aumento da remessa de recursos para o exterior. O déficit nas transações correntes acumulado nos últimos 12 meses é de US$ 78,9 bilhões.

Não há, pelo menos por enquanto, razão para desespero. Mas esse número indica que o governo precisa rever algumas de suas posturas em matéria de política externa e mesmo de sua política fiscal caso pretenda reverter esse quadro. O aumento da remessa de recursos para o exterior verificado em setembro coincide com o anúncio da decisão do governo de taxar os lucros e dividendos que as empresas que acreditaram e investiram no Brasil mandam para suas matrizes.

Rúpias indonésias

Embora o encontro entre Lula e Trump na Malásia possa ser considerado certo, é conveniente ir devagar nas relações entre o Brasil e os Estados Unidos porque as relações são frágeis e podem se deteriorar facilmente. O momento exige um mínimo de contenção verbal e as declarações feitas por Lula em Jacarta, na Indonésia, em seu caminho para Kuala Lumpur, não contribuíram para facilitar o entendimento.

Ao lado do presidente da Indonésia, Probowo Subianto, Lula falou sobre a possibilidade de os dois países utilizarem suas próprias moedas em seu comércio bilateral. Vale ressaltar que, desta vez, o presidente não defendeu, como em ocasiões anteriores, a criação de uma moeda alternativa ao dólar para as transações internacionais. Apenas mencionou a “possibilidade” de Brasil e Indonésia utilizarem suas próprias moedas em suas transações comerciais.

Resta saber, no entanto, se os frigoríficos brasileiros que exportam carne para o país asiático aceitarão fechar negócio em rúpias indonésias, a moeda local, ou se continuarão preferindo receber em dólares. E, na mesma medida, se os exportadores de tecidos e de outros produtos indonésios vendidos ao Brasil aceitarão o volátil real em pagamento por suas mercadorias.

O fato é que, por mais despretensiosa que tenha sido a declaração do presidente, não havia necessidade de tocar neste assunto justamente às vésperas de um possível encontro com Trump. O que o Brasil ganhou com essa declaração? Nada. Absolutamente, nada! O que o Brasil perdeu? A princípio, também nada. Mas lançar esse tipo de ideia, num momento em que há necessidade de desanuviar o ambiente, pode significar, no final das contas, um item a mais na extensa lista de tensões que se acumulam entre os dois países.

Triângulo dourado

Outro assunto abordado por Lula tem o potencial de prejudicar ainda mais o entendimento com os Estados Unidos. Ao comentar, em uma entrevista concedida na sexta-feira, as ações da marinha americana contra o tráfico de drogas e as mortes de traficantes que navegam pelo mar do Caribe levando cocaína da Venezuela e da Colômbia para os Estados Unidos, o presidente brasileiro fez uma declaração que não facilita o diálogo. “Os usuários são responsáveis pelos traficantes, que também são vítimas dos usuários”, disse Lula.

O próprio presidente reconheceu, horas depois, que a frase havia sido “mal colocada”. Ele, certamente, pretendia se referir à tese controversa, defendida pela esquerda sul-americana, de que o tráfico de drogas só assumiu novas dimensões devido ao grande número de usuários nos Estados Unidos dispostos a pagar muito pelo produto.

Não se trata de discutir o que o presidente quis dizer com suas palavras. A questão é: ele realmente precisava tocar nesse assunto? A resposta é: claro que não. A intenção, provavelmente, era criticar a ação enérgica dos Estados Unidos contra os traficantes venezuelanos e colombianos. Mas, ao dizer o que disse, causou constrangimento no país anfitrião. A Indonésia, assim como seus vizinhos, tem uma legislação antidrogas rigorosa. E seu rigor já resultou em execuções de brasileiros flagrados tentando entrar com cocaína no país.

Em 2015, o governo de Jacarta ignorou os pedidos de clemência feitos pelo Itamaraty e executou os brasileiros Marcos Archer Cardoso Moreira e Rodrigo Muxfeldt Gulart. O rigor da legislação antidrogas no Sudeste Asiático é justificado pelo estrago que o consumo causou em suas populações e pelo poder que os cartéis de drogas adquiriram na região.

O chamado “Triângulo Dourado”, formado por Tailândia, Laos e Mianmar, é um importante centro de produção de metanfetamina, e os governos locais não medem esforços para combater as facções que exploram essa atividade ilegal. Talvez por falha do Itamaraty, que não o alertou sobre o desconforto que esse tema causa no Sudeste Asiático, Lula fez suas declarações e, com certeza, gerou desconforto entre os governos locais.

Provocações recíprocas

A expectativa é que a conversa entre os dois presidentes aconteça neste domingo, apesar de declarações como essa e das provocações que Lula fez nas últimas semanas. Os auxiliares de Trump também não se contiveram e, nos últimos dias, criticaram a política interna e a situação dos direitos humanos no Brasil.

Sendo assim, como não se pode contar com o fim das provocações recíprocas, a expectativa é que nem o presidente do Brasil nem o presidente dos Estados Unidos levem em conta os exageros verbais de um lado e de outro e que não usem essas declarações como desculpa para interromper o diálogo sobre as tarifas de 50%. Mesmo que não voltem a ser os aliados cordiais que foram na maior parte dos últimos duzentos anos, que pelo menos trabalhem para remover os obstáculos que têm prejudicado o fluxo comercial entre eles.

Pelas divergências acumuladas entre os dois governos nos últimos dez meses do governo Trump, a missão de reaproximá-los é difícil, mas não impossível. O diálogo entre os dois países, que parecia promissor, parece ter perdido o fôlego nos dias seguintes ao encontro entre o chanceler Mauro Vieira e o secretário de Estado Marco Rubio na semana retrasada, em Washington. Houve interpretações de que o silêncio que se seguiu àquela reunião foi um sinal de que as conversas voltaram à estaca zero. Porém, a verdade não é essa.

Diplomacia é assim. As discussões diplomáticas mais tensas e delicadas não ficam a cargo dos chefes de Estado. Elas são conduzidas por negociadores experientes que investem horas, às vezes dias, para discutir os menores detalhes de um acordo. E vão avançando na hierarquia conforme vão resolvendo problemas mais técnicos.

Portanto, mesmo que Lula e Trump fiquem frente a frente, troquem cumprimentos e reafirmem a química que teria se manifestado entre eles, qualquer diálogo que mantenham em Kuala Lumpur terá caráter meramente simbólico. Nada que aconteça ali significará que tudo já está resolvido, que o entendimento entre o Brasil e os Estados Unidos está perfeito e que as tarifas serão reduzidas rapidamente.

O mesmo vale para o encontro não acontecer. Caso isso ocorra, não significará que os canais de negociações tenham sido fechados. As conversas entre os dois países prosseguem e continuarão, mesmo que Lula e Trump não considerem conveniente aparecerem juntos desta vez. Quando se trata de diplomacia, às vezes a decisão de não aparecerem na mesma foto é mais positiva do que um encontro festivo que não resulte em nada concreto. É preciso calibrar as expectativas. A pauta de negociações entre os dois países é extensa, e alguns diplomatas do Itamaraty acreditam que esse encontro, se acontecer, gerará mais expectativas do que resultados.

Há muitas condicionantes sobre a mesa, e, se elas não forem esclarecidas, as tensões persistirão e a economia brasileira continuará a pagar por isso.

Leia também

Tailândia e Camboja assinam novo cessar-fogo mediado por Trump

Milei vota nas eleições da Argentina sem falar com a imprensa

Dia do Servidor é antecipado em SP; veja o que abre e fecha

Lula (E) e Donald Trump (D)
Reprodução

Lula (E) e Donald Trump (D)

O encontro com o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, não consta da agenda oficial do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que desembarcou na sexta-feira em Kuala Lumpur, na Malásia, para participar, na condição de convidado, da reunião de cúpula da Associação das Nações do Sudeste Asiático. Também não foi mencionado entre os compromissos oficiais agendados pela Casa Branca — mas o próprio presidente Trump admitiu, a bordo do Air Force One, enquanto voava para Kuala Lumpur, que o encontro deve acontecer neste domingo.

Trump desembarcou na Malásia no sábado como o protagonista da reunião dos líderes de um grupo de países que, ao lado da Índia, estão entre as economias que mais crescem atualmente.

A trajetória dos países do Sudeste Asiático nos últimos anos explica o interesse de Lula, de Trump e de outros chefes de Estado pela reunião que acontece neste final de semana. Camboja, Filipinas, Indonésia, Laos, Malásia, Singapura, Tailândia e Vietnã, além de Brunei, Mianmar e Timor Leste — recentemente incorporado ao bloco — contam com uma população somada de 680 milhões de pessoas e têm em comum o fato de terem superado as dificuldades extremas em que viviam há duas ou três décadas.

Se continuarem no caminho que vêm seguindo em suas economias, como tudo indica que continuarão, e, sobretudo, se mantiverem o respeito pelo equilíbrio fiscal, logo estarão em uma situação semelhante à da Coreia do Sul. Para quem não se recorda, a Coreia do Sul era um país miserável até meados dos anos 1980. Tomou decisões necessárias e, em cerca de 40 anos, se transformou em uma economia rica, próspera e capaz de proporcionar oportunidades e bem-estar a seus cidadãos.

Os países do Sudeste Asiático — que isso sirva de lição ao Brasil — têm em comum o fato de terem tomado decisões que, uns mais e outros menos, abriram as portas para um ciclo vigoroso de desenvolvimento. De um modo geral, apostaram na industrialização e em relações comerciais desimpedidas com os países desenvolvidos como mola propulsora de seu desenvolvimento. Isso fez com que, ao longo deste século, deixassem a condição de peões secundários para se tornar peças estratégicas no tabuleiro geoeconômico global.

A inflação da Malásia é inferior a 1,5% ao ano e a atual taxa de crescimento é robusta, de 5,1%. Nas Filipinas, a inflação anual é de 1,3% e o crescimento, de 5,5%. A Indonésia registra uma inflação de 2,5% ao ano e um crescimento de 5%. O Vietnã tem uma inflação mais elevada do que a de seus vizinhos: 3,38% em um ano, porém cresceu 8,3% no ano passado. Os demais países da região seguem trajetórias semelhantes. Apenas para efeito de comparação, o Brasil tem uma inflação de 5,17% ao ano (bem acima do teto da meta definida pelo Conselho Monetário Nacional, que é de 4,5%) e deverá crescer, na melhor das hipóteses, 2,11% em 2025, conforme o Boletim Focus do Banco Central.

Produtos sofisticados

Esses números sugerem que uma aproximação com esse grupo de países pode gerar benefícios para o Brasil. Aprender com eles, então, geraria benefícios ainda maiores. Os países do Sudeste Asiático são destinos possíveis para parte das mercadorias brasileiras que deixaram de ser exportadas para os Estados Unidos desde a tarifa de 50% imposta por Trump, em agosto passado. Mas isso não resolve o problema. Por mais promissoras que sejam, essas economias precisam evoluir muito até reunirem as condições necessárias para absorver os produtos mais sofisticados e de maior valor agregado da pauta de exportações brasileiras — que, antes da tarifa, eram vendidos para o gigante norte-americano.

O resumo da história é o seguinte: a ampliação do comércio com os novos ricos do mundo é desejável e pode até compensar, em parte, a redução da entrada de dólares causada pela queda das exportações para os Estados Unidos. Mas não preenche uma lacuna aberta pela interrupção das vendas de um grupo especial de mercadorias que o mercado americano, e apenas ele, tem condições de importar neste momento.

As tarifas de 50% praticamente inviabilizaram as exportações de máquinas e equipamentos agrícolas para os Estados Unidos. O mesmo vale para máquinas industriais, autopeças, transformadores elétricos, móveis e madeira processada e outros itens da pauta nacional de exportações que são mais nobres do que os alimentos in natura. A restrição à entrada desses produtos no mercado americano pode gerar não apenas prejuízos para os fabricantes desses equipamentos, mas para todo o ecossistema de fornecedores e trabalhadores que se organizou em torno deles.

Caso o litígio com os Estados Unidos se prolongue, isso pode custar, por exemplo, um corte irrecuperável de empregos bem qualificados e bem remunerados, além de representar um retrocesso no que existe de mais moderno e dinâmico na indústria nacional. E gerar uma reação em cadeia que, no final das contas, fará do Brasil um lugar pouco confiável aos olhos dos investidores internacionais.

Para alguns analistas, esse fenômeno de consequências negativas já começou. Prova disso é o resultado das Contas Externas do país, que atingiu um déficit de US$ 9,8 bilhões em setembro — o pior resultado desde 1995. Isso se deve não só à redução do superávit comercial, mas também ao aumento da remessa de recursos para o exterior. O déficit nas transações correntes acumulado nos últimos 12 meses é de US$ 78,9 bilhões.

Não há, pelo menos por enquanto, razão para desespero. Mas esse número indica que o governo precisa rever algumas de suas posturas em matéria de política externa e mesmo de sua política fiscal caso pretenda reverter esse quadro. O aumento da remessa de recursos para o exterior verificado em setembro coincide com o anúncio da decisão do governo de taxar os lucros e dividendos que as empresas que acreditaram e investiram no Brasil mandam para suas matrizes.

Rúpias indonésias

Embora o encontro entre Lula e Trump na Malásia possa ser considerado certo, é conveniente ir devagar nas relações entre o Brasil e os Estados Unidos porque as relações são frágeis e podem se deteriorar facilmente. O momento exige um mínimo de contenção verbal e as declarações feitas por Lula em Jacarta, na Indonésia, em seu caminho para Kuala Lumpur, não contribuíram para facilitar o entendimento.

Ao lado do presidente da Indonésia, Probowo Subianto, Lula falou sobre a possibilidade de os dois países utilizarem suas próprias moedas em seu comércio bilateral. Vale ressaltar que, desta vez, o presidente não defendeu, como em ocasiões anteriores, a criação de uma moeda alternativa ao dólar para as transações internacionais. Apenas mencionou a “possibilidade” de Brasil e Indonésia utilizarem suas próprias moedas em suas transações comerciais.

Resta saber, no entanto, se os frigoríficos brasileiros que exportam carne para o país asiático aceitarão fechar negócio em rúpias indonésias, a moeda local, ou se continuarão preferindo receber em dólares. E, na mesma medida, se os exportadores de tecidos e de outros produtos indonésios vendidos ao Brasil aceitarão o volátil real em pagamento por suas mercadorias.

O fato é que, por mais despretensiosa que tenha sido a declaração do presidente, não havia necessidade de tocar neste assunto justamente às vésperas de um possível encontro com Trump. O que o Brasil ganhou com essa declaração? Nada. Absolutamente, nada! O que o Brasil perdeu? A princípio, também nada. Mas lançar esse tipo de ideia, num momento em que há necessidade de desanuviar o ambiente, pode significar, no final das contas, um item a mais na extensa lista de tensões que se acumulam entre os dois países.

Triângulo dourado

Outro assunto abordado por Lula tem o potencial de prejudicar ainda mais o entendimento com os Estados Unidos. Ao comentar, em uma entrevista concedida na sexta-feira, as ações da marinha americana contra o tráfico de drogas e as mortes de traficantes que navegam pelo mar do Caribe levando cocaína da Venezuela e da Colômbia para os Estados Unidos, o presidente brasileiro fez uma declaração que não facilita o diálogo. “Os usuários são responsáveis pelos traficantes, que também são vítimas dos usuários”, disse Lula.

O próprio presidente reconheceu, horas depois, que a frase havia sido “mal colocada”. Ele, certamente, pretendia se referir à tese controversa, defendida pela esquerda sul-americana, de que o tráfico de drogas só assumiu novas dimensões devido ao grande número de usuários nos Estados Unidos dispostos a pagar muito pelo produto.

Não se trata de discutir o que o presidente quis dizer com suas palavras. A questão é: ele realmente precisava tocar nesse assunto? A resposta é: claro que não. A intenção, provavelmente, era criticar a ação enérgica dos Estados Unidos contra os traficantes venezuelanos e colombianos. Mas, ao dizer o que disse, causou constrangimento no país anfitrião. A Indonésia, assim como seus vizinhos, tem uma legislação antidrogas rigorosa. E seu rigor já resultou em execuções de brasileiros flagrados tentando entrar com cocaína no país.

Em 2015, o governo de Jacarta ignorou os pedidos de clemência feitos pelo Itamaraty e executou os brasileiros Marcos Archer Cardoso Moreira e Rodrigo Muxfeldt Gulart. O rigor da legislação antidrogas no Sudeste Asiático é justificado pelo estrago que o consumo causou em suas populações e pelo poder que os cartéis de drogas adquiriram na região.

O chamado “Triângulo Dourado”, formado por Tailândia, Laos e Mianmar, é um importante centro de produção de metanfetamina, e os governos locais não medem esforços para combater as facções que exploram essa atividade ilegal. Talvez por falha do Itamaraty, que não o alertou sobre o desconforto que esse tema causa no Sudeste Asiático, Lula fez suas declarações e, com certeza, gerou desconforto entre os governos locais.

Provocações recíprocas

A expectativa é que a conversa entre os dois presidentes aconteça neste domingo, apesar de declarações como essa e das provocações que Lula fez nas últimas semanas. Os auxiliares de Trump também não se contiveram e, nos últimos dias, criticaram a política interna e a situação dos direitos humanos no Brasil.

Sendo assim, como não se pode contar com o fim das provocações recíprocas, a expectativa é que nem o presidente do Brasil nem o presidente dos Estados Unidos levem em conta os exageros verbais de um lado e de outro e que não usem essas declarações como desculpa para interromper o diálogo sobre as tarifas de 50%. Mesmo que não voltem a ser os aliados cordiais que foram na maior parte dos últimos duzentos anos, que pelo menos trabalhem para remover os obstáculos que têm prejudicado o fluxo comercial entre eles.

Pelas divergências acumuladas entre os dois governos nos últimos dez meses do governo Trump, a missão de reaproximá-los é difícil, mas não impossível. O diálogo entre os dois países, que parecia promissor, parece ter perdido o fôlego nos dias seguintes ao encontro entre o chanceler Mauro Vieira e o secretário de Estado Marco Rubio na semana retrasada, em Washington. Houve interpretações de que o silêncio que se seguiu àquela reunião foi um sinal de que as conversas voltaram à estaca zero. Porém, a verdade não é essa.

Diplomacia é assim. As discussões diplomáticas mais tensas e delicadas não ficam a cargo dos chefes de Estado. Elas são conduzidas por negociadores experientes que investem horas, às vezes dias, para discutir os menores detalhes de um acordo. E vão avançando na hierarquia conforme vão resolvendo problemas mais técnicos.

Portanto, mesmo que Lula e Trump fiquem frente a frente, troquem cumprimentos e reafirmem a química que teria se manifestado entre eles, qualquer diálogo que mantenham em Kuala Lumpur terá caráter meramente simbólico. Nada que aconteça ali significará que tudo já está resolvido, que o entendimento entre o Brasil e os Estados Unidos está perfeito e que as tarifas serão reduzidas rapidamente.

O mesmo vale para o encontro não acontecer. Caso isso ocorra, não significará que os canais de negociações tenham sido fechados. As conversas entre os dois países prosseguem e continuarão, mesmo que Lula e Trump não considerem conveniente aparecerem juntos desta vez. Quando se trata de diplomacia, às vezes a decisão de não aparecerem na mesma foto é mais positiva do que um encontro festivo que não resulte em nada concreto. É preciso calibrar as expectativas. A pauta de negociações entre os dois países é extensa, e alguns diplomatas do Itamaraty acreditam que esse encontro, se acontecer, gerará mais expectativas do que resultados.

Há muitas condicionantes sobre a mesa, e, se elas não forem esclarecidas, as tensões persistirão e a economia brasileira continuará a pagar por isso.

Comentar
Continua após a publicidade
Continua após a publicidade

Conexão1

  • Agronegócio
  • Automobilismo
  • Cotidiano
  • Economia
  • Entretenimento
  • Esportes
  • Gastronomia
  • Internacional
  • Notícias da TV
  • Política
  • Saúde & Bem-Estar
  • Tecnologia
  • Turismo e Viagem

Estados

  • Acre
  • Alagoas
  • Amapá
  • Amazonas
  • Bahia
  • Ceará
  • Distrito Federal
  • Espírito Santo
  • Goiás
  • Maranhão
  • Mato Grosso
  • Mato Grosso do Sul
  • Minas Gerais
  • Pará
  • Paraíba
  • Paraná
  • Pernambuco
  • Piauí
  • Rio de Janeiro
  • Rio Grande do Norte
  • Rio Grande do Sul
  • Rondônia
  • Roraima
  • Santa Catarina
  • São Paulo
  • Sergipe
  • Tocantins

Esportes

  • Atletismo
  • Basquete
  • eSports
  • Fórmula 1
  • Futebol
  • Futsal
  • Olimpíadas

Entretenimento

  • Assista ao Vivo
  • Cinema
  • Documentários
  • Filmes
  • Novelas
  • Séries
  • Música
  • Notícias da TV
  • Reality Shows

Gastronomia

  • Alimentação e saúde
  • Almoço
  • Bolos
  • Café da manhã
  • Doces e Sobremesas
  • Fitness
  • Jantar
  • Lanche da Tarde

Copyright © 2024 Conexão1. Todos os direitos reservados.

Conexao1
Nenhum resultado
Ver todos os resultados
  • Conexão1
  • Cotidiano
  • Esportes
  • Entretenimento
  • +55invest
  • Conexão Política
  • Tecnologia
  • Gastronomia
  • Automobilismo
  • Agronegócio
  • Mundo Nerd

Copyright © 2024 Conexão1. Todos os direitos reservados.