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pesquisadores revelam se eles podem se repetir

por Conexão1
11/10/25 | 07:12
em Cotidiano
Bertioga, litoral norte de SP, em 2023: maior chuva na história do Brasil provocou morte e destruição
Rovena Rosa/Agência Brasil

Bertioga, litoral norte de SP, em 2023: maior chuva na história do Brasil provocou morte e destruição

O Brasil deverá enfrentar eventos extremos mais intensos e contrastantes, com cada vez mais frequência, a exemplo da onda de ocorrências registradas em 2023. Serão chuvas mais fortes em algumas regiões e secas mais longas e severas em outras.

Essa é a conclusão de um estudo de cientistas brasileiros, com a participação de pesquisadores da Universidade Estadual Paulista (Unesp), que elucidou quais foram os fenômenos atmosféricos que contribuíram para ocasionar, pelo menos, três desastres climáticos avassaladores registrados naquele ano.

Chuvas extremas em 2023

Uma das autoras do artigo é Luana Pampuch, professora do Instituto de Ciência e Tecnologia (ICT) da Unesp em São José dos Campos (SP).

Há dois anos, o Brasil registrou a maior chuva na sua história, que atingiu o litoral norte paulista; uma seca intensa que reduziu os rios amazônicos aos menores índices de que se tem notícia e uma sequência de temporais que provocou enchentes e desabamentos no estado do Rio Grande do Sul.

De acordo com os pesquisadores, 2023 foi o ano que despertou os brasileiros para a dura realidade das mudanças climáticas.

Aquecimento global

O aumento da temperatura média da Terra é um dos fatores apontados pelo estudo como causador dessas ocorrências extremas, que tendem a se repetir, com mais intensidade.

Quando pesquisadores discutem se a Terra vai ultrapassar 1,5 °C ou 2 °C de temperatura acima dos níveis pré-industriais, o ponto de referência é o meio século entre 1850 e 1900 — quando já havia fábricas e outros emissores, mas não em quantidade suficiente para gerar um impacto perceptível no clima.

Naquele período, a humanidade emitiu 12 gigatoneladas (GtC) de carbono da Revolução Industrial até o ano de 1900, contra 380 GtC entre 1901 e 2013, de modo que o grosso do aquecimento aconteceu já durante o século 20.

“Um aumento de “só” 1,5 °C na temperatura média da Terra em relação a essa época (e vale lembrar que o ano de 2024 já ultrapassou pontualmente essa marca, com 1,55 °C) já é suficiente para causar alterações significativas no clima mundial. Mas, no ritmo atual das emissões e das políticas públicas para mitigá-las, o mais provável é que o planeta alcance ou até ultrapasse 2 °C até 2100,” diz o artigo.

Nesse cenário, os pesquisadores afirmam que fenômenos como os registrados em 2023 se tornarão mais frequentes, mais intensos ou ambas as coisas em um futuro próximo.

Chuvas fortes se tornarão 1,7 vezes mais frequentes e 14% mais intensas, enquanto estiagens passarão a ser 2,4 vezes mais comuns. E os ciclones podem até se tornar menos comuns, mas serão mais intensos.

“Esses fenômenos climáticos extremos impactam diretamente a agricultura, os recursos hídricos, a biodiversidade e aumentam a vulnerabilidade social das populações,” resume a pesquisadora Luana Pampuch.

Tragédia no litoral paulista

Em fevereiro de 2023, o município de Bertioga, no litoral norte de São Paulo, registrou o recorde nacional de 682,8 mm de precipitação em um intervalo de 24 horas, deixando 65 vítimas fatais e 338 desabrigados.

Rodovia Rio-Santos (BR-101)interditada por deslizamento de terra, em fevereiro de 2023
Divulgação/Governo de SP

Rodovia Rio-Santos (BR-101)interditada por deslizamento de terra, em fevereiro de 2023

De acordo com os pesquisadores, naquela ocasião, uma massa de ar frio oriunda do Oceano Atlântico encontrou o ar quente sobre a costa.

O estudo explica que massas com temperaturas e umidades diferentes se comportam um pouco como água e óleo, sem se misturar. Quando uma frente fria avança, ela ocupa a parte mais baixa da atmosfera por ser mais densa e empurra para cima o bolsão de ar mais quente.

Conforme o ar quente sobe, ele esfria. E, conforme esfria, perde capacidade de reter umidade — o que faz com que o vapor d’água condense e caia na forma de chuva.

A Serra do Mar, um degrau íngreme no relevo, ajuda nesse processo, já que o vento não tem como fugir do paredão e só pode mesmo subir.

Chuvas causadas por características do relevo são denominadas chuvas orográficas.

Ainda segundo os especialistas, esse é um fenômeno corriqueiro na geografia da região, mas acabou acentuado por condições anômalas no Oceano Atlântico, que estava entre 1ºC e 2°C mais quente do que o habitual — o que significa mais água evaporando e servindo de combustível para as tempestades.

O calor nas águas não é coincidência: em relação à média da era pré-industrial, a temperatura média da superfície dos oceanos já aumentou em 0,9°C por causa das emissões de gases de efeito estufa.

O resultado é que sempre haverá massas de ar mais quentes e mais vapor, o que se traduz em chuvas mais volumosas.

“Existe uma metodologia para atribuir um fenômeno climático extremo às mudanças climáticas de origem antropogênica; para identificar o quanto de um evento está associado à atividade humana. Não fizemos essas análises de atribuição neste artigo, mas o aumento na frequência e intensidade de eventos climáticos extremos é compatível com um planeta em aquecimento,” diz Camila Carpenedo, líder do Núcleo de Estudos sobre Variabilidade e Mudanças Climáticas da Universidade Federal do Paraná, coautora do artigo.

Ainda segundo o estudo, outro fator que contribuiu para a intensidade das chuvas naquele ano foi o chamado jato de baixos níveis sul-americano, popularmente conhecido como “rios voadores”.

O primeiro passo para entender os tais rios é a constatação de que os ventos que correm ao longo da linha do Equador, denominados ventos alísios, sempre sopram no sentido leste-oeste.

Essa via atmosférica de mão única é resultado de um mecanismo denominado efeito Coriolis, que empurra o ar que chega ao Equador na direção oposta à da rotação da Terra.

Normalmente, os alísios tentam levar o ar úmido da Amazônia para o Pacífico, mas, no meio do caminho, deparam-se com a Cordilheira dos Andes. A Cordilheira deflete esses ventos para regiões mais ao sul, o que alimenta chuvas.

Estiagem extrema na Amazônia

O ano de 2023 também foi marcado pela ocorrência das secas de primavera na Amazônia. A redução do nível do rio Amazonas de seus habituais 15,80m para 12,70m, na altura de Manaus, está diretamente ligada ao fenômeno El Niño, segundo o estudo.

Estiagem na Amazônia, em 2023; rios bateram menor marca
Rafa Neddermeyer/Agência Brasil

Estiagem na Amazônia, em 2023; rios bateram menor marca

Trata-se de um fenômeno climático cíclico, registrado na literatura pela primeira vez em 1578, que causa disrupções bem conhecidas e estudadas em todo o planeta.

Sua ocorrência está ligada à dinâmica do Oceano Pacífico. Normalmente, as águas rasas aquecidas pelo sol na costa da América do Sul são sopradas pelos ventos alísios para o Oeste, em direção ao continente asiático.

Conforme essa água quente se desloca, ela é substituída por água mais fria, que ascende de partes mais profundas do oceano.

O predomínio de água fria nos arredores da América do Sul também deixa o ar mais gelado, enquanto as águas quentes sopradas para as proximidades da Ásia aquecem a atmosfera naquela região.

Como o vento sempre se move de zonas frias e secas (em que a pressão do ar é mais alta) para zonas quentes e com formação de chuvas (zonas de baixa pressão, em que o ar sobe), a diferença de temperatura reforça os próprios ventos Leste-Oeste, que foram responsáveis por gerá-la originalmente.

É um processo cíclico, de retroalimentação, denominado célula de Walker.

“Atmosfera e oceano estão conectados, a gente não sabe o que acontece primeiro. Mas há um acoplamento entre as duas coisas,” diz Luana Pampuch.

Nos anos de El Niño, não há vento para empurrar as águas quentes do Pacífico rumo à Ásia, de modo que o oceano permanece aquecido nas redondezas do litoral das Américas e gera ali uma zona de baixa pressão, propensa a chuvas.

O problema é que, quando essa área chuvosa de baixa pressão se desloca, ela sai de cima da Amazônia, que passa a ter uma atmosfera de pressão mais alta e umidade menor. Daí decorre o longo período de estiagem.

Os pesquisadores salientam que todo esse processo é intensificado pelo aquecimento global, pois, quanto maior a temperatura média da Terra, mais as águas do Pacífico se aquecem e mais acentuada é a mudança subsequente.

A capacidade do El Niño de reverter os padrões do clima terrestre — fazendo chover onde normalmente é seco e causando secas onde normalmente chove — também tem uma parcela da culpa pela zona de alta pressão que se instalou sobre o centro do Brasil na mesma época das secas na Amazônia e levou à mais alta temperatura já registrada no país: 44,8 °C em Araçuaí (MG), no dia 19 de novembro de 2023.

“O El Niño está associado a um aquecimento anômalo das águas do Oceano Pacífico. Se a água está mais quente, por condução ela esquenta a atmosfera adjacente. Esse ar quente sobe, ocupa o lugar do ar mais frio e perturba a troposfera [camada da atmosfera mais próxima à superfície terrestre],” explica Camila Carpenedo.

Ainda segundo ela, essa perturbação gera ondas muito grandes na atmosfera, com um comprimento da ordem de 10.000 km. As cristas produzem áreas com alta pressão, ou vales, áreas de baixa pressão.

Ciclones no sul do país

Também em 2023, ao longo do inverno e da primavera, o Rio Grande do Sul e seus arredores foram afetados por quatro ciclones extratropicais notáveis.

Enchentes no Rio Grande do Sul, em 2023
Reprodução/Marinha RS

Enchentes no Rio Grande do Sul, em 2023

Eles atingiram seus picos nos dias 16 de junho, 12 de julho, 4 de setembro e 4 de outubro. Segundo os autores do artigo, todos ocorreram na época esperada.

“Em linhas gerais, esses fenômenos se sucedem com mais frequência na primavera e no outono, são mais intensos, ainda que não necessariamente mais frequentes, no inverno e diminuem no verão,” destacam.

O ciclone de junho derramou mais de 80% da precipitação esperada para o mês em uma área bastante restrita ao Nordeste do território gaúcho, próxima à Região Metropolitana de Porto Alegre.

O resultado foi a morte de 16 pessoas e cerca de 10 mil desabrigados.

O segundo, em julho, foi mais ameno, atingindo 60% da média de chuvas para o período; desabrigou mil pessoas e causou uma morte.

O fenômeno de setembro também bateu a marca de 60%, fez 54 vítimas fatais e afetou 359 mil pessoas em 106 cidades, especialmente no Vale do Taquari.

O ciclone de outubro de 2023, por sua vez, foi o mais fraco. A precipitação ficou entre 30% e 40% do esperado para o mês.

Em 2024, a tragédia no Rio Grande do Sul voltou a se repetir, com ainda mais intensidade. As enchentes devastadoras afetaram 478 das 497 cidades do estado, causando alagamentos, inundações e deslizamentos de terra.

Segundo explicação dos autores do estudo, o clima na Região Sul, localizada em uma latitude mais alta que o resto do país, sofre grande influência de ciclones extratropicais, porque se localiza perto da chamada frente polar, onde há condições ideais para a formação desses sistemas giratórios. Eles são uma parte corriqueira do clima entre os paralelos 30° e 60°.

“A tendência é que, com o aquecimento global, passe a ocorrer um número menor de ciclones, mas os que ocorrerem tendem a ser mais intensos,” explica Luiz Felippe Gozzo, professor do curso de Meteorologia da Faculdade de Ciências da Unesp, que não participou da elaboração do artigo.

De acordo com ele, o espaço de tempo entre um e outro vai ser maior, então a atmosfera acumula mais energia. Além disso, quando está mais quente, o ar consegue armazenar mais vapor de água. E aí ocorrem chuvas mais intensas.

“Fileira de dominós”

Mesmo considerando o aquecimento global como um dos causadores desses eventos extremos analisados, pesquisadores enfatizam que ele não é a causa de todos os desastres.

O artigo ressalta que é um trabalho intelectual árduo determinar a parcela de responsabilidade do aumento das temperaturas ao analisar cada uma dessas ocorrências.

Segundo os pesquisadores, fenômenos atmosféricos se comportam como uma fileira de dominós: uma mudança sutil em um único parâmetro do funcionamento do planeta é capaz de gerar uma reação em cadeia catastrófica.

“Os meteorologistas fazem o possível para decifrar esse quebra-cabeça. Mas evitar que coisas piores aconteçam é papel de governos, empresas e todos os demais atores que, infelizmente, falham em enfrentar de forma adequada as mudanças climáticas,” conclui o artigo, que envolveu 19 cientistas e teve seus resultados publicados nos Anais da Academia de Ciências de Nova York.

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Bertioga, litoral norte de SP, em 2023: maior chuva na história do Brasil provocou morte e destruição
Rovena Rosa/Agência Brasil

Bertioga, litoral norte de SP, em 2023: maior chuva na história do Brasil provocou morte e destruição

O Brasil deverá enfrentar eventos extremos mais intensos e contrastantes, com cada vez mais frequência, a exemplo da onda de ocorrências registradas em 2023. Serão chuvas mais fortes em algumas regiões e secas mais longas e severas em outras.

Essa é a conclusão de um estudo de cientistas brasileiros, com a participação de pesquisadores da Universidade Estadual Paulista (Unesp), que elucidou quais foram os fenômenos atmosféricos que contribuíram para ocasionar, pelo menos, três desastres climáticos avassaladores registrados naquele ano.

Chuvas extremas em 2023

Uma das autoras do artigo é Luana Pampuch, professora do Instituto de Ciência e Tecnologia (ICT) da Unesp em São José dos Campos (SP).

Há dois anos, o Brasil registrou a maior chuva na sua história, que atingiu o litoral norte paulista; uma seca intensa que reduziu os rios amazônicos aos menores índices de que se tem notícia e uma sequência de temporais que provocou enchentes e desabamentos no estado do Rio Grande do Sul.

De acordo com os pesquisadores, 2023 foi o ano que despertou os brasileiros para a dura realidade das mudanças climáticas.

Aquecimento global

O aumento da temperatura média da Terra é um dos fatores apontados pelo estudo como causador dessas ocorrências extremas, que tendem a se repetir, com mais intensidade.

Quando pesquisadores discutem se a Terra vai ultrapassar 1,5 °C ou 2 °C de temperatura acima dos níveis pré-industriais, o ponto de referência é o meio século entre 1850 e 1900 — quando já havia fábricas e outros emissores, mas não em quantidade suficiente para gerar um impacto perceptível no clima.

Naquele período, a humanidade emitiu 12 gigatoneladas (GtC) de carbono da Revolução Industrial até o ano de 1900, contra 380 GtC entre 1901 e 2013, de modo que o grosso do aquecimento aconteceu já durante o século 20.

“Um aumento de “só” 1,5 °C na temperatura média da Terra em relação a essa época (e vale lembrar que o ano de 2024 já ultrapassou pontualmente essa marca, com 1,55 °C) já é suficiente para causar alterações significativas no clima mundial. Mas, no ritmo atual das emissões e das políticas públicas para mitigá-las, o mais provável é que o planeta alcance ou até ultrapasse 2 °C até 2100,” diz o artigo.

Nesse cenário, os pesquisadores afirmam que fenômenos como os registrados em 2023 se tornarão mais frequentes, mais intensos ou ambas as coisas em um futuro próximo.

Chuvas fortes se tornarão 1,7 vezes mais frequentes e 14% mais intensas, enquanto estiagens passarão a ser 2,4 vezes mais comuns. E os ciclones podem até se tornar menos comuns, mas serão mais intensos.

“Esses fenômenos climáticos extremos impactam diretamente a agricultura, os recursos hídricos, a biodiversidade e aumentam a vulnerabilidade social das populações,” resume a pesquisadora Luana Pampuch.

Tragédia no litoral paulista

Em fevereiro de 2023, o município de Bertioga, no litoral norte de São Paulo, registrou o recorde nacional de 682,8 mm de precipitação em um intervalo de 24 horas, deixando 65 vítimas fatais e 338 desabrigados.

Rodovia Rio-Santos (BR-101)interditada por deslizamento de terra, em fevereiro de 2023
Divulgação/Governo de SP

Rodovia Rio-Santos (BR-101)interditada por deslizamento de terra, em fevereiro de 2023

De acordo com os pesquisadores, naquela ocasião, uma massa de ar frio oriunda do Oceano Atlântico encontrou o ar quente sobre a costa.

O estudo explica que massas com temperaturas e umidades diferentes se comportam um pouco como água e óleo, sem se misturar. Quando uma frente fria avança, ela ocupa a parte mais baixa da atmosfera por ser mais densa e empurra para cima o bolsão de ar mais quente.

Conforme o ar quente sobe, ele esfria. E, conforme esfria, perde capacidade de reter umidade — o que faz com que o vapor d’água condense e caia na forma de chuva.

A Serra do Mar, um degrau íngreme no relevo, ajuda nesse processo, já que o vento não tem como fugir do paredão e só pode mesmo subir.

Chuvas causadas por características do relevo são denominadas chuvas orográficas.

Ainda segundo os especialistas, esse é um fenômeno corriqueiro na geografia da região, mas acabou acentuado por condições anômalas no Oceano Atlântico, que estava entre 1ºC e 2°C mais quente do que o habitual — o que significa mais água evaporando e servindo de combustível para as tempestades.

O calor nas águas não é coincidência: em relação à média da era pré-industrial, a temperatura média da superfície dos oceanos já aumentou em 0,9°C por causa das emissões de gases de efeito estufa.

O resultado é que sempre haverá massas de ar mais quentes e mais vapor, o que se traduz em chuvas mais volumosas.

“Existe uma metodologia para atribuir um fenômeno climático extremo às mudanças climáticas de origem antropogênica; para identificar o quanto de um evento está associado à atividade humana. Não fizemos essas análises de atribuição neste artigo, mas o aumento na frequência e intensidade de eventos climáticos extremos é compatível com um planeta em aquecimento,” diz Camila Carpenedo, líder do Núcleo de Estudos sobre Variabilidade e Mudanças Climáticas da Universidade Federal do Paraná, coautora do artigo.

Ainda segundo o estudo, outro fator que contribuiu para a intensidade das chuvas naquele ano foi o chamado jato de baixos níveis sul-americano, popularmente conhecido como “rios voadores”.

O primeiro passo para entender os tais rios é a constatação de que os ventos que correm ao longo da linha do Equador, denominados ventos alísios, sempre sopram no sentido leste-oeste.

Essa via atmosférica de mão única é resultado de um mecanismo denominado efeito Coriolis, que empurra o ar que chega ao Equador na direção oposta à da rotação da Terra.

Normalmente, os alísios tentam levar o ar úmido da Amazônia para o Pacífico, mas, no meio do caminho, deparam-se com a Cordilheira dos Andes. A Cordilheira deflete esses ventos para regiões mais ao sul, o que alimenta chuvas.

Estiagem extrema na Amazônia

O ano de 2023 também foi marcado pela ocorrência das secas de primavera na Amazônia. A redução do nível do rio Amazonas de seus habituais 15,80m para 12,70m, na altura de Manaus, está diretamente ligada ao fenômeno El Niño, segundo o estudo.

Estiagem na Amazônia, em 2023; rios bateram menor marca
Rafa Neddermeyer/Agência Brasil

Estiagem na Amazônia, em 2023; rios bateram menor marca

Trata-se de um fenômeno climático cíclico, registrado na literatura pela primeira vez em 1578, que causa disrupções bem conhecidas e estudadas em todo o planeta.

Sua ocorrência está ligada à dinâmica do Oceano Pacífico. Normalmente, as águas rasas aquecidas pelo sol na costa da América do Sul são sopradas pelos ventos alísios para o Oeste, em direção ao continente asiático.

Conforme essa água quente se desloca, ela é substituída por água mais fria, que ascende de partes mais profundas do oceano.

O predomínio de água fria nos arredores da América do Sul também deixa o ar mais gelado, enquanto as águas quentes sopradas para as proximidades da Ásia aquecem a atmosfera naquela região.

Como o vento sempre se move de zonas frias e secas (em que a pressão do ar é mais alta) para zonas quentes e com formação de chuvas (zonas de baixa pressão, em que o ar sobe), a diferença de temperatura reforça os próprios ventos Leste-Oeste, que foram responsáveis por gerá-la originalmente.

É um processo cíclico, de retroalimentação, denominado célula de Walker.

“Atmosfera e oceano estão conectados, a gente não sabe o que acontece primeiro. Mas há um acoplamento entre as duas coisas,” diz Luana Pampuch.

Nos anos de El Niño, não há vento para empurrar as águas quentes do Pacífico rumo à Ásia, de modo que o oceano permanece aquecido nas redondezas do litoral das Américas e gera ali uma zona de baixa pressão, propensa a chuvas.

O problema é que, quando essa área chuvosa de baixa pressão se desloca, ela sai de cima da Amazônia, que passa a ter uma atmosfera de pressão mais alta e umidade menor. Daí decorre o longo período de estiagem.

Os pesquisadores salientam que todo esse processo é intensificado pelo aquecimento global, pois, quanto maior a temperatura média da Terra, mais as águas do Pacífico se aquecem e mais acentuada é a mudança subsequente.

A capacidade do El Niño de reverter os padrões do clima terrestre — fazendo chover onde normalmente é seco e causando secas onde normalmente chove — também tem uma parcela da culpa pela zona de alta pressão que se instalou sobre o centro do Brasil na mesma época das secas na Amazônia e levou à mais alta temperatura já registrada no país: 44,8 °C em Araçuaí (MG), no dia 19 de novembro de 2023.

“O El Niño está associado a um aquecimento anômalo das águas do Oceano Pacífico. Se a água está mais quente, por condução ela esquenta a atmosfera adjacente. Esse ar quente sobe, ocupa o lugar do ar mais frio e perturba a troposfera [camada da atmosfera mais próxima à superfície terrestre],” explica Camila Carpenedo.

Ainda segundo ela, essa perturbação gera ondas muito grandes na atmosfera, com um comprimento da ordem de 10.000 km. As cristas produzem áreas com alta pressão, ou vales, áreas de baixa pressão.

Ciclones no sul do país

Também em 2023, ao longo do inverno e da primavera, o Rio Grande do Sul e seus arredores foram afetados por quatro ciclones extratropicais notáveis.

Enchentes no Rio Grande do Sul, em 2023
Reprodução/Marinha RS

Enchentes no Rio Grande do Sul, em 2023

Eles atingiram seus picos nos dias 16 de junho, 12 de julho, 4 de setembro e 4 de outubro. Segundo os autores do artigo, todos ocorreram na época esperada.

“Em linhas gerais, esses fenômenos se sucedem com mais frequência na primavera e no outono, são mais intensos, ainda que não necessariamente mais frequentes, no inverno e diminuem no verão,” destacam.

O ciclone de junho derramou mais de 80% da precipitação esperada para o mês em uma área bastante restrita ao Nordeste do território gaúcho, próxima à Região Metropolitana de Porto Alegre.

O resultado foi a morte de 16 pessoas e cerca de 10 mil desabrigados.

O segundo, em julho, foi mais ameno, atingindo 60% da média de chuvas para o período; desabrigou mil pessoas e causou uma morte.

O fenômeno de setembro também bateu a marca de 60%, fez 54 vítimas fatais e afetou 359 mil pessoas em 106 cidades, especialmente no Vale do Taquari.

O ciclone de outubro de 2023, por sua vez, foi o mais fraco. A precipitação ficou entre 30% e 40% do esperado para o mês.

Em 2024, a tragédia no Rio Grande do Sul voltou a se repetir, com ainda mais intensidade. As enchentes devastadoras afetaram 478 das 497 cidades do estado, causando alagamentos, inundações e deslizamentos de terra.

Segundo explicação dos autores do estudo, o clima na Região Sul, localizada em uma latitude mais alta que o resto do país, sofre grande influência de ciclones extratropicais, porque se localiza perto da chamada frente polar, onde há condições ideais para a formação desses sistemas giratórios. Eles são uma parte corriqueira do clima entre os paralelos 30° e 60°.

“A tendência é que, com o aquecimento global, passe a ocorrer um número menor de ciclones, mas os que ocorrerem tendem a ser mais intensos,” explica Luiz Felippe Gozzo, professor do curso de Meteorologia da Faculdade de Ciências da Unesp, que não participou da elaboração do artigo.

De acordo com ele, o espaço de tempo entre um e outro vai ser maior, então a atmosfera acumula mais energia. Além disso, quando está mais quente, o ar consegue armazenar mais vapor de água. E aí ocorrem chuvas mais intensas.

“Fileira de dominós”

Mesmo considerando o aquecimento global como um dos causadores desses eventos extremos analisados, pesquisadores enfatizam que ele não é a causa de todos os desastres.

O artigo ressalta que é um trabalho intelectual árduo determinar a parcela de responsabilidade do aumento das temperaturas ao analisar cada uma dessas ocorrências.

Segundo os pesquisadores, fenômenos atmosféricos se comportam como uma fileira de dominós: uma mudança sutil em um único parâmetro do funcionamento do planeta é capaz de gerar uma reação em cadeia catastrófica.

“Os meteorologistas fazem o possível para decifrar esse quebra-cabeça. Mas evitar que coisas piores aconteçam é papel de governos, empresas e todos os demais atores que, infelizmente, falham em enfrentar de forma adequada as mudanças climáticas,” conclui o artigo, que envolveu 19 cientistas e teve seus resultados publicados nos Anais da Academia de Ciências de Nova York.

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