As indústrias de cinema e de games sempre tiveram uma relação simbiótica: jogos viram filmes e filmes viram jogos. Afinal, se um filme rende muita bilheteria, provavelmente um jogo baseado nele também atrairá consumidores, e vice-versa.
Nem sempre essa transição é bem-sucedida. Basta lembrar um exemplo traumático: o jogo de Atari baseado no filme E.T.: o Extra-Terrestre**, de 1982. A produção foi feita às pressas para que ele fosse lançado no Natal do mesmo ano, aproveitando tanto o sucesso do filme quanto as vendas dessa época. Foi um desastre completo que acabou catalisando a derrocada da indústria americana de games em 1983. A Atari teve que enterrar milhares de cartuchos do jogo em um deserto!
Mas, quando essa parceria funciona, os resultados podem ser realmente incríveis. Aqui vão sete grandes exemplos de adaptações da telona para os consoles:
7. The City of Lost Children (PS1, 1997)
Vou começar com um título bem controverso, que adapta um filme simplesmente magnífico. The City of Lost Children se assemelha muito a Resident Evil, Parasite Eve e outros belos títulos de quinta geração que abusaram do mix entre cenários pré-renderizados e personagens tridimensionais.
O resultado é um lindo jogo, com uma atmosfera cativante, mas que peca na dificuldade. Ela não é ajustável ou gradativa conforme você joga: o maior desafio é a completa falta de intuitividade em seus puzzles. Sério: algumas tarefas requerem ações que nenhum ser humano descobriria sem passar dezenas ou centenas de horas no jogo, correndo para lá e para cá, experimentando cada um dos itens em cada canto do cenário.
Ainda assim, a gameplay é interessante e até ousada para um pequeno estúdio de desenvolvimento. The City of Lost Children vale pela experiência de se imaginar dentro do que considero uma obra-prima da ficção científica francesa.
6. Aladdin (SNES, 1993)
Claro que a Disney iria aparecer aqui. A gigante do entretenimento foi e ainda é responsável por sucessos de bilheteria que acabam se estendendo a diversos produtos licenciados. No caso dos games, os exemplos são inúmeros, como O Rei Leão e até Pocahontas (um dos jogos mais lindos que já vi rodar no Mega Drive).
Mas Aladdin marcou a geração 16 bits. Foi produzido pela Capcom para o Super Nintendo, um ano após o bem-sucedido longa-metragem animado. Devido à guerra de consoles da época, houve outra versão para o Mega Drive. E não se trata apenas de um port do mesmo jogo: são duas experiências distintas, ambas excelentes.
A parceria Disney-Capcom-Nintendo, em particular, deu muito certo. Aladdin consegue narrar o enredo do filme com uma jogabilidade muito prazerosa, que evocava algo de **Prince of Persia**. É um jogo de plataforma bastante ágil, com comandos simples e mais interação com os obstáculos do cenário do que com os inimigos. É quase um “parkour das Arábias”, com escaladas acrobáticas e backflips carpados. Além de tudo, tínhamos a ótima trilha sonora hollywoodiana em versão 16 bits!
5. Spider-Man 2 (Playstation 2, 2004)
Com grandes poderes vem grandes responsabilidades, e com grandes bilheterias vêm grandes licenciamentos. Spider-Man 2 foi adaptado para vários consoles, mas essas versões variavam em qualidade. A do PlayStation 2 se destacou e provavelmente foi a mais jogada.
Ainda em 2004, havia aquele pequeno receio advindo do desgosto que Superman 64 havia deixado em sua passagem pelo console da Nintendo. Porém, **Spider-Man 2 rendeu ótimas horas de jogatina e acabou lavando a alma dos fãs de super-heróis.
O jogo se baseia no enredo do filme e adiciona alguns elementos dos quadrinhos, em um cenário de mundo aberto ambientado em Nova York. A jogabilidade foi inovadora: além do bom sistema de combate, das escaladas e do sentido aranha, a grande novidade foi a movimentação com teias. Nos games anteriores, o Homem-Aranha lançava suas teias para cima, em direção ao céu… era absurdo e tosco. Aqui, tivemos uma mecânica aprimorada, com o herói balançando em três dimensões, em uma jogabilidade fluida e empolgante para a época.
Além das missões principais, que avançam o enredo, havia várias secundárias, oferecidas por cidadãos comuns na rua. Você tinha que frustrar crimes, levar pessoas feridas para o hospital e até impedir que trabalhadores da construção civil caíssem de prédios!
Se você ainda tiver um PlayStation 2, este é um bom motivo para tirar a poeira do console.
4. Middle-Earth: Shadow of Mordor (vários consoles, 2014)
Acredito que J.R.R. Tolkien não podia imaginar a dimensão do impacto que sua literatura teria. Sua obra firmou os pilares do gênero conhecido como “fantasia medieval” em todas as mídias possíveis e influenciou a criação dos RPGs de mesa. Este game não vem diretamente da obra do autor, mas sim de suas adaptações cinematográficas, e por isso merece um espaço na lista – mesmo arriscando a ira dos Tolkianos mais puristas.
Middle-Earth: Shadow of Mordor se passa no período entre as trilogias de O Hobbit e O Senhor dos Anéis. O clima de ação e os cenários deixam claro que a referência imediata são os filmes, e não exatamente os romances em que eles se baseiam.
O jogador assume o papel de Talion, um capitão do reino de Gondor, sacrificado por orcs junto com sua família. Mas o ritual acaba, inadvertidamente, ligando o personagem a um elfo sem memória, mantendo-os amaldiçoadamente vivos. Daí, segue toda aquela busca por vingança, que é recheada de revelações, como você bem conhece em jornadas heroicas desse tipo.
O cenário da Terra Média, os combates fluidos e a dinâmica nas interações com a sociedade orc fazem esse título valer a pena. Sua sequência, Middle-Earth: Shadow of War, de 2017, foi ainda melhor.
3. Alien Isolation (vários consoles, 2014)
No mesmo ano de Shadow of Mordor, chegava aos consoles Alien Isolation, baseado na famosa franquia de horror e ficção científica. Ela já havia gerado algumas adaptações pífias, mas esse aqui veio para acertar as contas com as origens da série.
Os produtores trouxeram de volta o clima do primeiro filme, de 1979, tanto na estética, na tecnologia (que parece ao mesmo tempo moderna e antiga) e, claro, no suspense. Estamos em um survival horror em primeira pessoa, na pele de Amanda Ripley, filha da protagonista dos filmes.
Em busca de sua mãe, Amanda acaba presa em uma imensa estação espacial, onde, além de outros passageiros, temos o “oitavo passageiro”: o terrível xenomorfo. Nosso objetivo é tentar sair de lá com vida, contando apenas com alguns equipamentos e quase nenhuma arma. Não temos como matar o poderoso alien, e isso gera uma característica fundamental no gênero: a sensação de impotência e desamparo. Temos que nos valer da furtividade e da estratégia. A inteligência artificial elaborada do inimigo e os vários momentos de susto tornam o jogo ainda mais inesquecível.
2. Rambo III (Mega Drive, 1989)
Depois de já ter dado uma colher de chá para o Super Nintendo com Aladdin, deixe-me enaltecer esta joia do Mega Drive. Era magnífico poder jogar um jogo do Rambo no conforto de sua casa, em 1989. E ainda alternando duas mecânicas de gameplay: um shooter de visão superior, com movimentação em oito direções; e outro shooter, de terceira pessoa, para enfrentar tanques e helicópteros de guerra.
Mesmo para a época, o jogo era curto demais e você podia finalizá-lo em menos de uma hora. Mas isso está longe de ser um demérito. Você tinha o orgulho de poder zerar o game antes que seus pais reclamassem que o console estava muito quente!
1. 007 Goldeneye (Nintendo 64, 1997)
007 GoldenEye era sucesso garantido nas locadoras que tinham disponíveis um Nintendo 64 e quatro controles. E olha que a gente quase ficou sem essa obra-prima!
Houve vários percalços durante o desenvolvimento. A Nintendo até cortou o financiamento! Sobrou para a produtora Rare, que teve de bancar tudo sozinha no fim da produção. Havia ainda a desconfiança sobre o formato: naquela época, shooters em primeira pessoa eram um gênero mais voltado a PCs e às máquinas robustas de Arcade. Os poucos títulos para consoles costumavam ser ports muito aquém dos originais.
Porém, o resultado final foi surpreendente. Foi um ótimo FPS para os padrões da época, que inovou não apenas por trazer o gênero para os consoles, mas também pela temática de agente secreto. As missões envolviam elementos como roubo de documentos e invasão de computadores, em vez de apenas aqueles tiroteios desenfreados.
Isso sem falar no modo multiplayer, numa época em que as jogatinas online mal existiam! O jogo se valeu dos quatro slots de controle do Nintendo 64, criando um multiplayer local para a gente se digladiar com nossos amigos. Surgia ali um dos embriões dos multiplayers FPS atuais.